A SANTINHA DO DOUTOR ZENO E A INFIDELIDADE CONJUGAL
José Hildor Leal (*)
Zeno Veloso é um grande jurista brasileiro, dispensando apresentações, e não raro nos brinda com textos que levam à reflexão, como este publicado no Jornal “O Liberal”, de Belém, com o título “Santinha quer excluir fidelidade”.
O fato é o seguinte: Santinha deseja que o tabelião faça constar na escritura pública de pacto antenupcial, pela qual será adotado o regime da separação de bens no casamento que vai contrair com Luizinho, a condição de que sempre no mês de novembro o casal terá férias conjugais, podendo manter outros romances, inclusive com direito a sexo, sem que isso implique violação aos deveres conjugais.
O notário procurado negou-se a dar curso ao ato, alegando imoralidade e ofensa aos princípios jurídicos superiores, com o que foi ameaçado de denúncia e processo.
Doutor Zeno cita Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald, Rodrigo da Cunha Pereira e Conrado Paulino da Rosa, para os quais as disposições atinentes à fidelidade e práticas sexuais não convencionais seriam permitidas.
Por outro lado ressalta que o art. 1.655, do Código Civil brasileiro, declara nula a convenção ou cláusula que contravenha disposição absoluta de lei, além do Enunciado nº 635, aprovado na VIII Jornada de Direito Civil, dispondo que “O pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar”.
E informa a doutrina de Rolf Madaleno, que entende ineficaz a disposição que admita infidelidade conjugal, além de Fabiana Domingues Cardoso, que em monografia dedicada ao tema lembra Pontes de Miranda, assim como outros autores, para os quais os deveres mínimos dos cônjuges, fixados em lei, não podem ser modificados pelo pacto antenupcial.
E esta é a corrente que acompanho, solidarizando-me com o colega que se recusou a lavrar o pacto com permissão de infidelidade.
Se a intenção do casal é “pular a cerca” de modo consentido em novembro, ou quando quer que seja, que o façam, mas sem o aval do tabelião.
Por mais que a sociedade evolua e os direitos individuais sejam renovados e relativados, há princípios básicos que não podem ser afastados pela vontade que afronte norma cogente.
Sou adepto da velha expressão latina: “dura lex sed lex”. A lei é dura, mas é lei.
A Santinha que me perdoe.
(*) Tabelião, Especialista em Direito Registral Imobiliário
